quarta-feira, outubro 17, 2007

Ela se foi

Ela se foi, simplesmente
Em sua barca na bruma do lago
Desapareceu no ínfimo tempo
De minha tão ínfima vida
Veio e me trouxe luz
Trouxe-me paz para as noites
E força para cada dia
Deu-me vontade de viver
Ainda mais e demais
Devolveu-me os melhores sonhos
Meu sorriso há muito esquecido
Fez-me chorar de alegria
E emocionar-me com a saudade
De repente a bruma
No lago brumoso
Sua barca distante
Ela se foi
Simplesmente
Como que de repente
E levou-me tudo

16/10/2007 – 14:54

terça-feira, outubro 09, 2007

MalDita Poesia

I

Em tudo que falo penso tão triste
Sentindo tão duro tanto sê-lo
Amarga hora maldita passa
De graça dilacera o que desespera
Já não sê-lo sem o silêncio
Mesmo sendo o grito só solidão
A imensidão que abarca aniquila
O vazio que envolve tudo supõe
Acaba ermo passo próximo em falso
Tão distante do que se ergue em sonhos
Dissonantes canções de cadafalso
Grande queda vôo tudo de volta
E em volta tudo que se afunda
Cega ilusão quimérica irônica
Sem luzes nem candelabros
Sempre um chão que se abre devora
Nunca um caminho apenas certo
Tão perto tudo se demora
Decerto quando erro acerto
Alguma palavra fora de hora
Linda e absurda histriônica
Agora a romper a fazer falta
O que sobra de vida soçobra
E o que me cobra esquece
Essa tristeza pura e incauta
De perder cada disso que não recobra
E me dobra dor tão profunda
Fecunda lágrima ardor inquieto
Meu teto de esperanças de sobra
Desejo de chão não ser completo
Um anseio criação nenhuma obra
Só ensejo de poesia moribunda

II

Basta que pense viver não dura
Pura angústia desnorteante
Basta que saiba efemeridade
Tocar o que a mão não segura
Impura imaginação desconcertante
Descria mundos finda eternidade
Necessidade tarde ver uma parte
Cegar-se para tudo tão importante
Pairar acima do que não é realidade
Na verdade mentir outra certeza
Com presteza ser só insignificante
O quanto antes negar beleza
Dispensar a hipócrita caridade
Iluminar-se perder a clareza
Renascer para o que é mortificante
Aceitar de vez o que não se atura
Em devaneios do que não se disse
Se não visse mais que um instante
Essa resignação com a incerteza
Intolerante luz para a cegueira
A vida inteira uma cela escura
Tão fria e vazia sufocante
Indolente com a hora derradeira
Tão certa com o que abjura
Imatura inspiração sorrateira
Altaneira de uma fé alienante
Diante da precisão do inesperado
Desesperado com o que se esgueira
Saturado do que não se queira
À beira do que não se tem buscado
Mais uma palavra, sequer mais uma
De uma poesia já agonizante

III

Andar caminhos nenhum jardim
Fados e sonhos nenhuma porta
Abismos e pontes nada que há em mim
O medo, enfim, mais uma folha morta
E corta o céu de meus dias
Cinza-escuro que azul aborta
Jasmim de minhas noites vazias
Garganta silêncio voz entrecorta
Se me dobra morta por que farias
Segredos de mais uma verdade morta?
Um mar espesso, perdido, ermo
Milhares de naus vidas sombrias
Perto e longe e onde meio-termo?
As luzes vagas o medo a praga
Um porto negro em terras fugidias
Onde a alma atraca tudo estraga
E traga a luz com o que me iludirias
Traz de além do além escuridão
Toda a treva para o meio-dia
E chama morte o que é solidão
Triste e duro como o que seria
Apenas dura e triste imensidão
Sem estrelas céu e chão
Sem palavras de uma inútil poesia
Tudo e nada faria pura desolação
Nasceria, viveria, morreria
Cansada alma dilacerada
Por nada não mais voaria
Calaria cada palavra marcada
Marcaria cada palavra que silencia
Matar cada palavra silenciada
De uma poesia assim desesperada

22/05/2007 – 12:40 * 23/05/2007 – 01:40 * 29/05/2007 – 19:11

sexta-feira, outubro 05, 2007

Um quase soneto do medo de te perder

Estás aqui comigo e eu me aquieto,
Em teu seio, meu abrigo, descanso
Da dura lida da vida, eu amanso
Feroz temor de ser nada ao ser completo.

Estás aqui comigo e eu me esqueço
Das dores que sinto sem lamentar,
O grito contido que minto não ecoar
A tudo o que ouve que não te mereço.

Estás aqui comigo e tenho medo
Do dia que vem de vez tirar-te de mim
Ou ocultar-te quando eu tanto clamo.


Quando de tudo que sinto faço segredo,
Sem dar por mim que conter um grito assim
Revelará a tudo o que vive que eu te amo.

Brinca a Vida

Brinca comigo a vida
Mente que brinca e fere
Fere brincando comigo
Dia a dia sangrando
Uma tão aberta ferida
Séria e brinca ainda
De pintar dias tristes
E tristes madrugadas
Depois de noites escuras
Brinca a vida de estar morta
E finda

Brinca a vida e amanhece
Mais um dia sangrando
De ferir sempre brincando
Brinca a vida e esquece
Essa aberta ferida a doer
E assim a vida vai passando
Eu o mesmo sempre sangrando
Tão incapaz de esquecer
A vida sempre brincando
Como quem não conhece
Um outro jeito de doer
Um nada que parece
Tão duro de se viver
Porque a vida brinca
E mente que brinca
Quando só fere
Nada mais sabe fazer
Do que ferir e brincar
De pintar-me tão triste
Em noites tão escuras
E não resiste
A madrugadas tão duras
Em brincar insiste
E em ferir ainda
E brinca e fere
Só não finda

Perdo-me o amor

Não me condene toda essa confusão interior
É tanto amor misturado com coisas tantas
Numa mesma forma e no forno assando
Passando do ponto e queimando
Perdoe-me se quiser quando puder
Os passos que levam até você
E as lágrimas que afligem
Se afligem ou incomodam
Perdoe-me existir
E aparecer no seu caminho
Ter entrado na sua vida
Pela mesma porta por que saí
Perdoe-me viver à sombra
De tudo o que você não me deixou ser
Não me queira mal mais do que já quis
Não tenha por mim raiva ou pena
Ou melhor, não tenha nada
Que já estou acostumado
Mas não tenha repugnância
Não me veja como o estorvo de sua vida
O contrapeso de suas boas lembranças
Não me odeie mais do que eu mereça
E não me mate mais do que o possível
Não me esqueça mais do que o necessário
E nem me despreze mais do que o suficiente
Não me deixe plantado na sua frente
Mais que o suportável
Não me deixe dizer mais do que o fútil
Que é útil (ou inútil?)
E não deixe por fim de comparecer
Ao enterro de minha última esperança
Nem à festa de aniversário de meu desespero
E quando eu tiver ido, por favor
Crie minha angústia
Como se ela fosse sua

São Paulo - 05/04/2005 – 17:22

Mais Nada

Agora eu fico só
Só isso e mais nada
Não sei se essa solidão
Cabe no apartamento
Não sei se virei pó
Uma rocha triturada
Perdida na imensidão
Espalhada pelo vento
A estrada deu um nó
Tropecei na caminhada
Perdi de vez a direção
Passos no esquecimento
Agora eu virei só
A alma estrangulada
Nem sonho nem ilusão
Gritos no sofrimento
Agora eu fico pó
Na beira da estrada
Viagem desatinada
Nada de arrependimento
A vida deu um nó
No meio da caminhada
Triste impressão
Morri no esquecimento
O amor me fez só
O amor se fez pó
O amor é um nó
Só isso e mais nada
Não há estrada
Nem caminhada
Rumo ou direção
Sonho ou ilusão
Nem imensidão
Há solidão
Mais nada

São Paulo - 12/07/2005 – 17:02 (Terceiro lugar no XV Concurso de Poesia da Universidade São Judas Tadeu, em 30/09/2005)

quinta-feira, outubro 04, 2007

Minha tristeza


Minha tristeza não é feita de lágrimas
É feita de ausências de amanhãs
De falta de sorrisos e luz dos olhos
Minha tristeza é um quarto vazio
Uma noite escura sem lua
Uma pessoa que não vem pela rua
Minha tristeza é assim tão minha
Tão minha que se parece com a sua

Minha solidão é tão terna
E minha vida tão pequena
Não sei sentir nem ser humano
Ao lado de humanos seres
Minha solidão tão triste
A si mesma se consola
No inevitável da hora
De ser a solidão tão triste e eterna

Então, de repente, mais um olhar no espelho
Um eu que me olha olhando eu olhar para ele
Um descompasso, um desconcerto, um aperto
Um certo cansaço de estar sempre certo
E triste e solitário ao mesmo temível tempo
Um contratempo de desencontrar-se
Um sentir-se tão bem e tão forte
Com a tristeza e a solidão tão serenas
Coisas pequenas de grandes pessoas de verdade

segunda-feira, outubro 01, 2007

Errando poesia

É com a vida que erro minha poesia
E com a poesia erro meus sonhos
E com meus versos em sonhos erro a vida
Porque erro meus versos em vida quando sonho
Eu me componho não de vida e sonhos
Mas de meus versos errando minha poesia

É com a estrada que erro meus passos
Meu descompasso de sentir-me tão medonho
Eu me descomponho no que faço
Sonho de vida, em poesia, tão enfadonho
E no fazer-me em versos é que me desfaço
E no desfazer em versos a vida é que sonho

E em versos a vida é o que não canto
Em meu canto sem compasso me esvazio
E vazio de mim a vida é um desencanto
Em versos sem compasso eu desvario
A poesia que erro é um pranto
E o pranto em versos é o que silencio

É com a poesia que erro o dom de amar
E é amando que erro o dom de existir
No que muito canto é que sei calar
Calando o grito é que posso resistir
A todo silêncio em mim que não pode clamar
E a todo o amor que em mim não pode mentir

Mas que se pudesse com certeza mentiria
E se acaso mentisse, seria poesia


06/06/2006 – 14:46

Beijo


No silêncio da noite
Tão implacável saudade
De sua boca me chama
E sem qualquer piedade
Faz-me revirar na cama

No silêncio da noite
Um sonho apenas
Sua boca que me quer
Para delícias serenas
De boca de mulher
Na calada da noite

Toco sua boca
Que me toca
Sem me dizer
O que provoca
Falta sua boca
Com que me toca
Sua boca de querer
O que não se quer
Sua boca de querer
Ser mais que mulher

Sua boca em minha mente
Sua boca tão ofegante
Minha boca impaciente
Sua boca mais um instante
Sua boca ausente
Da minha tão distante


30/03/2007 – 17:03 * 02/04/2007 – 01:24

As horas


Meus dias delírios de ócios
Minhas horas consumadas
Nesse desfazer-se a tempo
De se refazer em delírios
E consumar-se nesses ócios
Cegar-se com abundância de luz
Que tanto se desperdiça.

Meu silêncio nada mais que um grito
Sufocado, calado não sei onde no peito
O feito já desfeito satisfeito
Perfeito no que se tem de imperfeito
Um pretérito de todo o medo
Uma certa preguiça imperativa
De um futuro incerto para qualquer coragem
Desses míseros sonhos que são vendidos
Em troca de nada caro para a alma.

Passos marcados em tantos descaminhos
De um caminhar em vão, aonde vão?
Sempre um lamento na mais certa hora
Um canto de outrora por ora silêncio
Saudade do que ainda se vai ser
Quando o que fomos é estarmos mortos
E vencidos em luta nenhuma
Lembrados agora em nenhuma canção.

Era dura a luta e éramos jovens
Estarmos velhos é ser a luta outra
Delírios inconsumíveis dessas horas
Nesses ócios de meus dias consumidos
Não me resta agora absurda coragem
E nem ócios vãos e vãos delírios
Nem me resta luta alguma
Só as horas


14/08/2007 – 22:38 * 28/08/2007 – 01:06